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Juiz de si mesmo.




Posso sentar-me? perguntou timidamente o principezinho.

- Eu te ordeno que te sentes - respondeu-lhe o rei, que puxou majestosamente um pedaço do manto de arminho.

Mas o príncipe se espantava. O planeta era minúsculo. Sobre quem reinaria o rei? - Majestade... eu vos peço perdão por ousar interrogar-vos...

- Eu te ordeno que me interrogues - apressou-se o rei a dizer.

- Majestade... sobre quem é que reinais?

- Sobre tudo - respondeu o rei, com uma grande simplicidade.

(…)

Tanto poder maravilhou o pequeno príncipe.

(…)

Fazei-me esse favor. Ordenai ao sol que se ponha...

- Se eu ordenasse a meu general voar de uma flor a outra como borboleta, ou escrever uma tragédia, ou transformar-se numa gaivota, e o general não executasse a ordem recebida, quem, ele ou eu, estaria errado?

- Vós, respondeu com firmeza o principezinho.

- Exato.

(…)

O principezinho bocejou. Sentia falta de seu pôr do sol. E, também, já estava começando a se aborrecer!

- Não tenho mais nada que fazer aqui - disse ao rei. - Vou prosseguir minha viagem.

- Não partas - retrucou o rei, que estava orgulhoso de ter um súdito. - Não partas; eu te faço ministro!

- Ministro de quê?

- Da... da justiça!

- Mas não há ninguém para julgar!

- Nunca se sabe - disse o rei. - Ainda não vi todo o meu reino. Estou muito velho, não tenho espaço para uma carruagem, e andar cansa-me muito.

- Oh! Mas eu já vi - disse o pequeno príncipe, que se inclinou para dar ainda uma olhadela no outro lado do planeta. - Não consigo ver ninguém...

Tu julgarás a ti mesmo - respondeu-lhe o rei.

É o mais difícil. É bem mais difícil julgar a si

mesmo que julgar os outros. Se consegues

fazer um bom julgamento de ti, és um

verdadeiro sábio.

É comum receber Ministros da Própria Justiça na sessão de terapia.

As sentenças são apressadas, esses ministros pouco ou nada analisam dos autos, as evidências. Pelo menos não aquelas em favor do réu, si mesmo. As qualidades, capacidades e conquistas são diminuídas quando (e se) são reconhecidas.

É preciso ter empatia com si mesma, diz uma paciente. Me surpreendo e fico feliz com a descoberta. Ser juíz de si mesma é uma tarefa árdua e a empatia, tão abundante para com o outro, falta, escassa escorre por entre os veios das mãos que punem rigorosamente o menor dos enganos.

Há um ano sofrendo com ataques de pânicos no local de trabalho a paciente, durante a primeira sessão, decreta a sentença: sou muito fraca.

Protesto! Diz o psicólogo de defesa.

Há um ano passando por isso quase todos os dias e continua trabalhando, estudando, namorando… Você é muito forte! Um ano de ataques de pânico não é pra qualquer um.

Assim sigo, o Psicólogo advogado de defesa contra o paciente até que ele compreenda que não precisa ser assim, que ele pode dar-se a chance e a oportunidade de arriscar-se a ser quem ele é e errar, não para simplesmente errar, mas para aprender, evoluir.

Erremos juntos, então, durante a sessão, rumo a planetas novos e distantes onde haja o mais belo pôr do sol.


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