A frase de Goethe atravessa a experiência humana com uma simplicidade que desarma. Conhecimento e amor, que a filosofia e a ciência tantas vezes colocaram em campos opostos, aparecem aqui como inseparáveis. O amor, nesse contexto, não é apenas um afeto, mas uma abertura radical ao outro e ao mundo. É por meio dessa abertura que algo se torna conhecido, não porque é capturado pela lógica, mas porque é habitado pela sensibilidade. Quando pensamos essa ideia pela lente da psicanálise, particularmente na perspectiva de Sándor Ferenczi, o amor emerge como um elemento estruturante, uma força capaz de engendrar não apenas vínculos, mas também conhecimento e transformação.
Ferenczi, em sua clínica e em sua obra, insistia em algo revolucionário: o analista não é um observador neutro, mas um participante sensível, implicado no campo afetivo que se cria na relação com o paciente. Para ele, o amor — entendido não no sentido romântico, mas como cuidado, empatia e disposição para compreender o sofrimento do outro — era o que tornava possível o acesso às profundezas da psique. O amor, aqui, é a condição do conhecer. Sem ele, o sujeito permanece como um enigma inacessível, protegido por defesas construídas ao longo de uma vida inteira de feridas e perdas.
Pensemos, por exemplo, na ideia de confusão de línguas, uma das contribuições mais significativas de Ferenczi. Ele descreve o trauma como um rompimento na comunicação, onde a linguagem do desejo e do cuidado é substituída pela violência ou pela indiferença. Nesses momentos, o amor — enquanto força organizadora — é desviado de seu curso natural, e o sujeito é condenado a viver em um estado de não saber, de não se conhecer, porque não houve um outro que o amasse o suficiente para traduzir sua experiência. Conhecer-se e ser conhecido, para Ferenczi, dependem dessa tradução amorosa, dessa ponte que só pode ser construída pela presença empática de outro ser humano.
Se expandirmos essa ideia, podemos dizer que todo conhecimento verdadeiro é atravessado pelo amor, porque conhecer implica um ato de despojamento, de abrir-se ao desconhecido sem a pretensão de dominá-lo. O amor nos ensina a suportar a alteridade, a encarar aquilo que não compreendemos sem destruí-lo, sem reduzi-lo a categorias que nos tranquilizem. É por isso que a relação analítica, quando bem-sucedida, se torna um lugar de renascimento. Não porque o analista ensine algo ao paciente, mas porque, ao amá-lo em sua singularidade, cria as condições para que ele se reconheça.
Esse amor, no entanto, não é sem conflito. Ferenczi sabia que o amor terapêutico é também uma luta contra os fantasmas internos, contra as resistências e os ressentimentos que ambos, analista e paciente, trazem para o encontro. Ele não é um estado idealizado, mas um processo dinâmico, cheio de falhas e reparações. E é justamente nessas falhas que reside sua potência. O amor que conhece é aquele que suporta o imperfeito, que insiste no vínculo mesmo diante da ruptura.
Se voltarmos à frase de Goethe, talvez possamos entendê-la como uma provocação ética e existencial. Nada conhecemos afora aquilo que amamos porque o amor é o único modo de sair de nós mesmos, de habitar o mundo do outro sem colonizá-lo. Ferenczi, ao propor uma psicanálise fundada no cuidado e na reciprocidade, nos lembra que conhecer é sempre um ato de vulnerabilidade. E, nessa vulnerabilidade, reside a possibilidade de um encontro que transforma.
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